Saúde E Bem Estar – Em feito inédito, “vagina em chip” promete ajudar contra infecções


Dispositivo criado na Universidade Harvard contém células do epitélio vaginal humano e replica características fisiológicas reais do órgão

Pesquisadores do Instituto Wyss, da Universidade Harvard, nos EUA, criaram um chip que replica o microambiente do tecido vaginal humano, incluindo seu microbioma. Chamado de “Vagina Chip”, ele reproduz muitas das características fisiológicas do órgão e pode ser inoculado com diferentes cepas de bactérias para estudar seus efeitos na saúde da vagina.

A vagina como ela é

“Um grande obstáculo para esse estudo foi que não havia bons modelos pré-clínicos que pudessem ser usados ​​para estudar quais terapias podem realmente tratar a vaginose bacteriana em tecidos humanos. O projeto da nossa equipe era criar um chip de vagina humana para ajudar no desenvolvimento e teste de novas terapias para vaginose bacteriana,” revela, em nota, a coautora Aakanksha Gulati, pesquisadora de pós-doutorado no Wyss.

A vaginose bacteriana ocorre quando há uma instabilidade no microbioma vaginal, podendo comprometer a fertilidade feminina e ocasionar outras complicações, como a doença inflamatória pélvica.

Estima-se que ela afete 30% das mulheres em idade reprodutiva em todo o mundo, e é considerada causadora de partos prematuros. Além disso, ela também pode aumentar o risco de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV.

Não sendo um assunto amplamente estudado, a criação do chip só foi possível graças a um financiamento da Fundação Bill e Melinda Gates, que visava criar um tratamento bioterapêutico contra vaginose bacteriana para nações com poucos recursos.

“Há um reconhecimento crescente de que cuidar da saúde da mulher é fundamental para a saúde de todos os seres humanos, mas a criação de ferramentas para estudar a fisiologia feminina humana está atrasada”, pondera o autor sênior, Don Ingber, que é o diretor fundador do Instituto Wyss.

Feito de células humanas

No artigo publicado em 26 de novembro no periódico Microbiome, os autores do estudo explicam que é difícil conduzir ensaios pré-clínicos com o microbioma vaginal, uma vez que ele é diferente dos modelos encontrados em outros animais.

Por isso, o chip é composto a partir da doação de epitélio vaginal humano e de células subjacentes do tecido conjuntivo. Assim, ele replica muitas das características fisiológicas reais da vagina, até mesmo o microbioma bacteriano.

Com auxílio da plataforma Microfluidic Organ Chip, desenvolvida no Wyss, a equipe semeou o canal superior do chip com células epiteliais vaginais humanas e recriou a estrutura da parede vaginal com células fibroblásticas uterinas. Essas células foram colocadas ao lado oposto da membrana permeável que separa os canais superior e inferior.

Como resultado, após cinco dias, o Vagina Chip desenvolveu várias camadas distintas de células diferenciadas que correspondem às encontradas no tecido vaginal humano. Quando os cientistas introduziram o hormônio sexual feminino estradiol, uma forma de estrogênio, os padrões de expressão do gene do chip mudaram, o que indica que ele era sensível aos hormônios tal qual o órgão.

Com o modelo pronto, os cientistas resolveram deixá-lo saudável primeiro antes de inocular as bactérias da vaginose. Com a ajuda de Jacques Ravel e sua equipe da Escola de Medicina da Universidade de Maryland, eles criaram três comunidades bacterianas diferentes, cada uma contendo várias cepas de Lactobacillus crispatus, bactéria encontrada em microbiomas vaginais saudáveis.

Ao entrar em contato com o chip, as bactérias começaram produzir ácido lático, que ajuda a manter o baixo pH da vagina e inibe o crescimento de outros micróbios, transformando o chip em um ambiente sem bactérias. Assim, a equipe inoculou os chips vaginais com diferentes espécies de bactérias: Gardnerella vaginalis, Prevotella bivia e Atopobium vaginae, atreladas à vaginose bacteriana.

Ao entrarem em contato com o chip, as bactérias aumentam o pH, danificando as células epiteliais vaginais e aumentando significativamente a produção de múltiplas citocinas pró-inflamatórias. Essa resposta é a mesma encontrada em mulheres quando são acometidas por essas bactérias.

Com a constatação do bom funcionamento, o chip está sendo testado em tratamentos novos para vaginose bacteriana a fim de identificar terapias eficazes que podem ser avançadas em ensaios clínicos. Os autores também estão trabalhando na integração de células imunes no chip para estudar como o microbioma vaginal pode impulsionar as respostas do sistema imunológico sistêmico.

Fonte: Globo .com. Galileu Saúde