Tecnologia – Tirar o celular da tomada antes de 100% não estraga a bateria? Entenda

Especialista explica como funcionam as baterias modernas, o que evitar no carregamento e quais hábitos realmente prolongam a vida útil do seu aparelho.
Se você ainda espera seu celular atingir 100% para só então desconectá-lo do carregador, não está sozinho. Muita gente segue essa rotina com medo de estragar a bateria, um receio que tem origem em tecnologias antigas, mas que já não se aplica mais à maioria dos smartphones modernos. Com o avanço dos celulares, as baterias também evoluíram, mas o mito do “vício” parece ter uma vida útil mais longa do que muitos dispositivos. Por isso, entender como as baterias modernas funcionam e quais são as melhores práticas de carregamento não só reduz essa preocupação, mas também pode prolongar significativamente a durabilidade do seu smartphone.
Mas, afinal: é melhor interromper o carregamento em 80% ou só parar ao chegar aos 100%? E carregar à noite é mesmo perigoso? O TechTudo conversou com o engenheiro de energia e consultor de eficiência energética, Ricardo Lima, que ajuda a desmontar alguns mitos e diz quais hábitos que realmente fazem diferença na utilização do smartphone. Veja a seguir:
A origem do mito
Para entender as razões pelas quais essa crença sobre a duração da carga das baterias do celular persiste até os dias atuais, é necessário fazer uma contextualização histórica. O medo de tirar o celular da tomada antes de uma carga completa vem da época das baterias de níquel-cádmio (NiCd) e, em menor grau, das de níquel-hidreto metálico (NiMH). Essas tecnologias, utilizadas nos primeiros aparelhos fabricados nas décadas de 1980 e 1990, sofriam com o que era conhecido como “efeito memória” ou o “vício da bateria”. Se não fossem carregadas até o fim, passavam a “esquecer” a parte não usada da carga, reduzindo sua capacidade total com o tempo.
Com a evolução tecnológica, as baterias de íon-lítio (Li-ion) surgiram e rapidamente se tornaram o padrão para a maioria dos eletrônicos portáteis, incluindo os celulares. A grande vantagem é que as baterias de íon-lítio não sofrem com o “efeito memória”. Mas a lenda da “bateria viciada” continua passando de geração para geração, mesmo com a recomendação de fabricantes para nem sempre deixar o carregamento chegar até os 100%.
O que dizem os especialistas
Especialistas e fabricantes são categóricos: as baterias de íon-lítio não sofrem com o efeito memória e, na verdade, manter a carga entre 20% e 80% é o ideal para prolongar a vida útil. O consultor Ricardo Lima reforça esse entendimento.
“Carregar o celular até 70% ou 80% pode ser benéfico para a vida útil da bateria. Isso porque, quando existe o carregamento até 100%, existe uma alta de voltagem no local, fator que possibilita uma maior degradação dos materiais internos da bateria. Outro ponto é o aquecimento. Quanto mais quente, maior a possibilidade de degradação e, com cargas excessivas, pode ocorrer uma redução da vida útil da bateria no longo prazo com a carga total recorrente”
O especialista revela que interromper o carregamento antes do nível máximo, por volta dos 80%, pode contribuir para prolongar sua vida útil. Isso ocorre porque, ao limitar a carga, é possível aumentar o número de ciclos de carregamento, que são utilizados como referência para medir a durabilidade da bateria. Dessa forma, ao controlar o nível de carregamento, o usuário consegue aumentar a eficiência e ao mesmo tempo preservar o desempenho e a longevidade do componente.
Em geral, as baterias de celular possuem uma longevidade entre 500 e 2.000 ciclos, o que varia de dois a quatro anos, dependendo do modelo, fabricante ou hábitos de uso. Depois desse período, a bateria começa a perder capacidade de performance. Lima ressalta que alguns estudos apontam que a carga parcial consegue ampliar a longevidade da bateria por até um ano. Mas ele lembra que esse acréscimo é variável, já que leva em conta fatores como tempo de uso, tipo de aparelho, fabricante e ciclos de recarga.
“O ideal é não deixar a bateria zerar nem ficar em 100% constantemente. Extremos são inimigos da longevidade. Uma descarga completa estressa a bateria tanto quanto uma carga completa prolongada”
Como funcionam as baterias modernas
As baterias de íon-lítio funcionam com base em ciclos de carga e descarga. Cada bateria tem um número limitado de ciclos de vida útil, geralmente entre 500 e 1000 ciclos completos entre os aparelhos mais populares. Entretanto, esses ciclos não significam recargas, mas sim o equivalente a esse número de descargas e recargas completas. Ou seja, carregar de 50% a 100% conta como meio ciclo. Portanto, ao contrário do que muitos imaginam, a carga parcial não danifica e nem reduz a durabilidade da bateria.
Outra boa notícia é que os carregadores e os sistemas operacionais dos celulares modernos são muito mais inteligentes do que no passado. Eles são projetados para gerenciar a carga automaticamente e evitar a sobrecarga, superaquecimentos e perdas de eficiência. Segundo Ricardo, não existe nenhum risco imediato de deixar o celular carregando após os 100% – em condições normais, vale ressaltar. Ele afirma que o carregador e o circuito interno já são projetados para evitar problemas ao alcançar a carga máxima.
“É como se houvesse uma rampa de carregamento, no início ela é mais íngreme e veloz e quando vai chegando no finalzinho ela se estabiliza com o carregamento bem mais lento. Portanto, quando chega a carga completa, a passagem de energia é praticamente nula, tendo apenas uma modulação para permitir pequenos carregamentos para manter os 100%”
O engenheiro enfatiza ainda a importância do carregador original do celular, já que ele faz esse controle de carga em conjunto com o smartphone. “Se o carregador não for original ou o usuário utilizar um carregador turbo para ter um carregamento mais rápido, é preciso ter atenção”, alerta. Ao usar acessórios do tipo, a carga pode gerar mais calor e aquecer o smartphone, o que aumenta as chances de acidentes em alguns casos.
Além disso, fabricantes como Apple, Samsung e Xiaomi implementaram funções de carregamento inteligente. Essas tecnologias aprendem seus hábitos de uso e, quando ativadas, podem frear a carga em 80% e só completar até 100% pouco antes do seu horário habitual de uso, minimizando o tempo que a bateria permanece totalmente carregada.
Boas práticas recomendadas
Para prolongar a vida útil das baterias de íon-lítio, como as utilizadas em smartphones, é fundamental adotar boas práticas no dia a dia. Um dos principais cuidados recomendados é manter a carga da bateria entre 20% e 80%, evitando os extremos de carga total ou descarga completa. Segundo Ricardo Lima, essa faixa reduz o estresse da bateria, contribuindo para sua durabilidade a longo prazo. Outro ponto importante é evitar o superaquecimento, já que o calor acelera reações químicas que degradam a bateria. Não deixar o celular exposto ao sol, em ambientes muito quentes ou dentro de carros fechados, além de remover a capinha durante o carregamento, são medidas simples que ajudam a dissipar o calor.
O uso de carregadores e cabos originais ou certificados também é essencial. Equipamentos de baixa qualidade podem fornecer corrente inadequada e não possuem mecanismos de segurança, o que representa risco tanto para a bateria quanto para o próprio aparelho. Lima destaca que os carregadores projetados especificamente para o modelo do celular garantem um carregamento seguro, rápido e eficiente. Da mesma forma, evitar o uso intenso do aparelho enquanto ele está carregando, como jogar ou assistir vídeos, contribui para reduzir o risco de superaquecimento e, portanto, de desgaste prematuro da bateria.
Além disso, não deixar a bateria zerada por longos períodos é considerada uma boa prática. Manter o sistema operacional do smartphone sempre atulizado é outra prática recomendada, já que muitas atualizações incluem melhorias na gestão de energia e desempenho da bateria.
Por fim, o gerenciamento das configurações do sistema também faz diferença. Ajustar o brilho da tela, usar o modo escuro em telas OLED e AMOLED, reduzir o tempo de inatividade da tela e restringir a atividade de aplicativos em segundo plano são medidas eficazes. Os modos de economia de bateria oferecidos pelos sistemas Android e iOS podem ser úteis em momentos de necessidade. Também é aconselhável desligar conexões como Wi-Fi, Bluetooth e dados móveis quando não estiverem em uso, especialmente em locais com sinal fraco, onde o aparelho tende a gastar mais energia tentando se conectar.
Quanto a aumentar a autonomia diária sem precisar recorrer ao carregador com tanta frequência, o especialista reforça que o consumo está diretamente ligado ao uso. Ele recomenda fechar os recursos que não estão sendo utilizados no momento ou em segundo plano, reduzir a quantidade de notificações e verificar com regularidade a opção “Bateria” no celular. Nessa função, é possível obter dados sobre o consumo de energia de cada aplicativo, além de descobrir os vilões que fazem a bateria descarregar rapidamente.
Ricardo Lima destaca também a evolução das baterias em si, mesmo que muitos pensem que não – principalmente ao comparar com modelos antigos, com carga suficiente para vários dias de uso. Segundo ele, a autonomia maior estava relacionada não à capacidade do componente, e sim ao uso dos aparelhos, que tinham funções limitadas a chamadas, mensagens e outras atividades bem menos exigentes que de um smartphone.
“Aa evolução das baterias é inegável, mas foi acompanhada por um crescimento igualmente expressivo no consumo de energia. Ainda que novas tecnologias estejam sendo desenvolvidas para ampliar a capacidade das baterias, o aumento do uso intensivo dos aparelhos tende a continuar. Dessa forma, a insatisfação com a duração da bateria não se deve apenas às limitações técnicas, mas principalmente à maneira como utilizamos os dispositivos atualmente.”
Fonte: Tec Tudo