Ceclimar publica nota sobre a Consulta Pública das Diretrizes Ambientais para os Municípios do Litoral Norte
O Ceclimar (Centro de Estudos Costeiros Limnológicos e Marinhos da UFRGS) publicou, na última sexta-feira, 26 de julho, nota sobre a Consulta Pública das Diretrizes Ambientais para os municípios do Litoral Norte, que está sendo realizada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente. A entidade critica a estrutura atual do documento e constata um afrouxamento das diretrizes propostas.
Confira a nota-
“O Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro (ZEEC) é um instrumento legal de diagnóstico e uso do território, o qual visa assegurar a qualidade ambiental dos recursos hídricos, solo e a conservação da biodiversidade. Para as zonas costeiras, é amparado pelo Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei Federal nº 7661/1988, regulamentada pelo Decreto nº 5.300/2004). É um instrumento de planejamento que estabelece diretrizes ambientais, permitindo identificar as restrições e potencialidades de uso dos recursos naturais. O Litoral Norte do RS possui um ZEEC que foi resultado de anos de trabalho conjunto entre o órgão ambiental competente e a comunidade, tendo sido publicado no ano 2000 (“Diretrizes ambientais para o desenvolvimento dos municípios do Litoral Norte” – FEPAM, 2000).
No ano de 2021, a FEPAM deu início ao trabalho de atualização deste importante documento, o qual entrou para Consulta Pública em 03 junho de 2022 (Zoneamento Ecológico Econômico Costeiro do Litoral Norte do Rio Grande do Sul – ZEEC LN, de 31 de maio de 2022). No dia 23 de junho de 2022 foi suspensa a consulta Pública (Diário Oficial do Estado do RS, Protocolo: 2022000737018) e não se obteve mais notícias do referido documento. No dia 24/04/2024 foi aberta Consulta Pública do documento intitulado “Diretrizes Ambientais para os Municípios do Litoral Norte do Rio Grande do Sul” (de 25 de março de 2024), o qual foi suspenso por motivo da calamidade pública (DOE, Protocolo: 2024001000384) e reaberto em 26/06/2024 pelo período de 30 dias (DOE, Protocolo: 2024001110355).
Em análise dos documentos, constata-se um gradual afrouxamento das diretrizes propostas. Termos como “não permitir”, por exemplo, foram substituídos por “evitar”, um termo com conotação mais abrangente e inerentemente mais permissivo.
De maneira geral, criticamos a estrutura da nova versão do documento, haja visto que excluiu-se do documento original as METAS para cada zona, as quais estão explícitas no documento vigente/2000 (ainda que novos limites para zonas tenham sido definidos, as metas deveriam constar explicitamente para cada área/zona). Além disso, as metas atualmente vigentes foram alteradas de forma a descaracterizar muitas das atividades a serem restringidas e as que devem ser estimuladas em cada zona (restrições e potencialidades), constituindo-se em um grande retrocesso ao desenvolvimento sustentável do Litoral Norte do RS. Estas supressões propostas no documento que está para consulta pública demonstram que o zoneamento para o Litoral Norte do RS está desconfigurado quanto ao seu caráter de instrumento de PLANEJAMENTO, o qual deve servir de balizador para ações futuras em cada zona. Apontamos, ainda, a falta de identificação da equipe técnica responsável pelo documento colocado para Consulta Pública.
ZONA COSTEIRA EM PERIGO
O Estado do Rio Grande do Sul, reconhecido como pioneiro nacionalmente na luta ambiental, foi um dos pioneiros no processo de elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro (ZEEC) no país (MMA, 2017; Anele, 2022). O Gerenciamento Costeiro e o ZEEC estavam contemplados no Capítulo XVI-Do Gerenciamento Costeiro, Artigos 236-244 do Código Ambiental Estadual do ano 2000. Porém, recentemente o capítulo referente ao Gerenciamento Costeiro foi alterado e reduzido a apenas três artigos no novo Código Estadual de Meio Ambiente no ano 2020 – Capítulo XIV, Artigos 206-208, configurando, junto a diversos outros itens, minuciosamente explicitados por Ferraz e Becker (2024) em nota técnica recentemente divulgada – a flexibilização e enfraquecimento da legislação ambiental, a qual caracteriza um retrocesso para a efetiva sustentabilidade ambiental, além de potencializar os riscos à população justamente em virtude de tal flexibilização (contaminação dos solos e águas doces, perda de serviços ecossistêmicos, perda de qualidade ambiental, não-garantia da manutenção e valorização da cultura local).
Posicionamento
Rechaçamos o documento proposto pela SEMA na Consulta Pública da forma que está, desrespeitando as metas já delineadas para as zonas, desconsiderando toda a produção técnica e científica existente, nem as agendas ambientais nacionais e internacionais, e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável-ODS, com grande desrespeito à proclamada Década dos Oceanos.
O CECLIMAR é um Centro de pesquisas atuante há 46 anos no Litoral Norte do RS, e, nesse contexto reiteramos a nossa manifestação desfavorável ao conteúdo apresentado, haja visto que as Diretrizes atualmente vigentes são mais adequadas para garantir o PLANEJAMENTO e a SUSTENTABILIDADE do litoral norte do RS.
Ainda, reafirmamos a necessidade de se desenvolver um PLANO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL PARA O LN DO RS, no qual a ciência seja considerada, e o meio ambiente respeitado considerando seus limites e restrições. As diretrizes apresentadas pelo documento, não estão de acordo com as necessidades ambientais locais.
Recentemente, enfrentamos enchentes históricas no estado, com milhares de refugiados climáticos que saíram das regiões afetadas e se deslocaram a outras áreas, especialmente o Litoral Norte do RS. Historicamente, o litoral norte do RS é uma região que experiência flutuações populacionais drásticas, particularmente durante os meses de veraneio, o que aumenta sensivelmente as pressões ambientais. Em um contexto de previsão de emergências climáticas cada vez mais frequentes e de maior intensidade, a tendência é que o litoral norte cada vez mais sofra pressões de aumento e flutuação populacional. De acordo com o Atlas Socioeconômico do RS, o crescimento populacional no litoral norte do RS, de 2010 a 2018 ficou entre 1,5% e 1,8% ao ano, o que representa mais de três vezes a média do Estado (i.e., 0,47%) (disponível em: https://atlassocioeconomico.rs.gov.br/). Dos 20 municípios com as maiores taxas de crescimento populacional no RS, sete estão no litoral, sendo que alguns deles (e.g., Arroio do Sal e Imbé) aumentaram suas populações em cerca de 25% de 2010 a 2017. O mesmo documento aponta que a região, composta por 20 municípios, expandiu sua área urbana em mais de 85% entre 2000 e 2010. Mais uma vez, os indicadores de crescimento populacional e expansão urbana demonstram a crescente pressão antrópica sobre os ecossistemas costeiros do litoral norte do RS, e também a necessidade de subsídios para uma tomada de decisões que levem em conta os objetivos do desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, a flexibilização da legislação ambiental vai de encontro com a nova fase em que vivemos, em que é preciso adotar medidas para conservação e uso sustentável da biodiversidade local, assim como da geodiversidade. A flexibilização abre caminhos para empreendimentos insustentáveis que podem culminar em novas tragédias climáticas, desta vez no próprio litoral. Assim, precisamos adotar o princípio da precaução, recuar neste momento e realizar estudos aprofundados, antes de tomar medidas que futuramente causem novos desastres.”
Foto- Divulgação
Dapraia News/CECLIMAR/TVN
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