Casal de mulheres realiza inseminação caseira e a dupla maternidade é reconhecida pela justiça


Porto Alegre (RS) – Após ação da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), duas mulheres tiveram a maternidade socioafetiva reconhecida pela Justiça na última sexta-feira (20). O caso precisou ser ajuizado porque o casal optou por realizar uma inseminação caseira – devido ao alto custo cobrado pelas clínicas de fertilização – e, por esse motivo, os Cartórios de Registros Civis alegaram a impossibilidade de registro da dupla maternidade. 

As gaúchas Eduarda Ficagna Kroeff Nascimento, 27 anos, marceneira e Luiza Pacheco Nascimento, 25 anos, artesã, Estão juntas há 4 anos e meio e casadas há 1 ano e 7 meses. “A decisão pela inseminação caseira foi entre 2020 e 2021, após entrarmos em contato com diversas clínicas de reprodução assistida. Nos deparamos com valores que chegavam a 40 mil reais, bastante fora do nosso orçamento, e protocolos criados para mulheres com infertilidade, o que não era nosso caso. Por isso optamos pela inseminação caseira, comentam.

A inseminação caseira, forma escolhida para ter o bebê, não é recomendada por médicos, traz riscos à saúde, mas cresce impulsionada pela crise econômica e pelas redes sociais. Os possíveis riscos não impediram que Eduarda e Luiza levassem adiante o desejo de aumentar a família. “Os riscos existem se não houver realização de exames, sobretudo para rastreio de ISTs” afirma Luiza, que está gestando os gêmeos.  Ambas as partes realizaram todos os exames necessários e verificaram a compatibilidade genética entre doador e a futura mãe. Os bebês (gêmeos, um menino e uma menina) foram gerados com sêmen de doador anônimo. “Portanto ele não é da nossa convivência e sequer residimos na mesma região que ele e foram quatro ciclos. No quarto tivemos nosso positivo”, afirmam.

O bebês ainda não nasceram, devem chegar até o final deste mês de Outubro. A previsão é de que eles nasçam antes do tempo e necessitem de leito em UTI neonatal. No hospital, a orientação que as mães receberam é de que somente o pai e a mãe registrais estariam autorizados a acompanhar as crianças na UTI. Por isso o registro se fazia tão necessário. O processo judicial é necessário porque o CNJ contempla apenas casos de reprodução assistida em clínicas. Portanto, quem opta pela inseminação caseira não consegue registrar diretamente no cartório sem alvará de autorização. O processo levou menos de quatro meses desde a data da entrada até a emissão do alvará.

A petição inicial foi preparada pela defensora pública Paula Pinto de Souza e a equipe da 4ª Defensoria Pública Especializada em Ajuizamento, com o suporte do Núcleo de Defesa da Diversidade Sexual e de Gênero (NUDIVERSI) da Defensoria Pública, atendendo às peculiaridades do caso e principalmente ao relacionamento havido entre as mães dos gêmeos. “Tentamos de forma clara dar vida à história de amor e à preparação da maternidade de ambas as assistidas. A decisão é bastante inovadora, no que tange ao fato de que as crianças ainda não terem nascido, mas sem dúvidas é um alento para os casais homoafetivos e famílias multiparentais que planejam ter filhos”, comemorou Paula.

Conforme a juíza da Vara de Família do Foro Regional da Tristeza, ainda que a inseminação tenha sido realizada de maneira caseira, não se pode deixar de ressaltar o direito de ambas as autoras de registrar os nascituros em seus nomes e de a segunda mãe acompanhar todo o processo gestacional. “No momento, em havendo claramente a declaração de existência de um projeto existencial e familiar comum, o importante é garantir aos nascituros e às mães o pleno gozo de todos os direitos resultantes dos seus nascimentos e do reconhecimento da maternidade socioafetiva. Ressalto e concluo, novamente, que os nascituros, certamente foram concebidos porque ambas as autoras, mães, assim desejaram”, afirmou a juíza em sua decisão.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da ADPF 132/RJ e da ADIN 4277/DF, reconheceu que pessoas do mesmo sexo podem constituir família, e que, em decorrência disso, os mesmos direitos e deveres de uniões estáveis heteroafetivas se estendem aos companheiros das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo.

Fonte: Defensoria/RS Jornalista TV Nativoos- Dejair Krumenan